terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Placa art déco: Héracles e o Leão de Némea - Sacavém



Mais uma das placas que compõem a série “Os 12 Trabalhos de Héracles”, no caso “Héracles e o Leão de Némea”. Placa quadrada, de cerâmica moldada, simulando bronze, de verdete manchado, tendo os contornos angulosos das figuras a bronze dourado como se houvesse desgaste no metal. Representa um nu masculino lutando com um leão apostos sobre três quadrados concêntricos em degraus, dentro de uma gramática art déco. Junto à pata inferior do leão, inscrito na pasta, G. No tardoz, inscrito na pasta, à mão, APAR e Nº 3.
Data: c. 1935-45
Dimensões: Alt. 28,5 cm x larg. 28,5 cm x espessura 0,9 cm


Ao contrário da placa anteriormente apresentada, não só o trabalho dos esmaltes é nesta peça muito superior, sendo perfeita a ilusão que se trata de uma placa de bronze, como a forma representa um quadrado regular, ligeiramente menos espesso. Estamos em crer que será de uma fornada mais antiga que a primeira, dada a qualidade geral da mesma: nitidez de composição, tipo de esmaltes, para além de se encontrar marcada no tardoz e, à frente, portar a inicial do seu autor, o G indiciando Donald Gilbert como seu presumível escultor. A opção pela simples inicial do nome, por oposição ao «Gilbert Sc» com que costumava assinar as suas criações, foi certamente deliberada face a uma excessiva presença numa superfície quase plana.


Filho do mortal Anfitrião e de Alcmena, Héracles é, na verdade, filho de Zeus, e daí a ira da mulher deste, Hera, contra o herói, pelo que terá engendrado os Doze trabalhos. Mais uma vez sem entrar em grandes detalhes sobre o mito, que também tem diversas variantes, o leão de Némea é um monstro irmão de outra conhecida monstruosidade, a célebre Esfinge de Tebas. Filho de Ortro e Equidna, terá sido uma criação de Hera que o colocou na região de Némea onde devorava habitantes e gado. Héracles ficou hospedado em casa de um humilde agricultor, Molorco, a quem o leão tinha devorado o filho. Em jeito de homenagem ao ilustre hóspede, Molorco quis matar o único carneiro que lhe restava. Contudo, Héracles pediu-lhe que o mantivesse durante 30 dias, findos os quais, se não regressasse da caçada ao leão, o deveria sacrificar em sua memória.
O leão era invulnerável e vivia numa caverna com duas aberturas. Fracassada que foi a tentativa de matar o leão com arco e flechas, pois nem o ferro nem o fogo afectavam a sua pele, Héracles com o auxílio de uma clava obrigou-o a entrar na gruta. Encerrou uma das aberturas e com os braços estrangulou-o. Só com o auxílio das próprias garras do leão, conseguiu esfolá-lo devidamente passando o herói a utilizar a pele como manto.
Como no trigésimo dia Héracles não regressasse, Molorco tomou-o como morto e preparava-se para honrar o seu compromisso quando lhe surge o herói vestido com a pele da besta. O carneiro foi, então, sacrificado a Zeus Salvador, e no local do sacrifício Héracles decretou a criação dos Jogos Nemeus em honra de seu pai. Depois levou os despojos do leão até Micenas e seu primo Euristeu, espantado e assustado com tal proeza, proibiu-o de entrar na cidade, ordenando-lhe que, a partir daí, deixasse os seus futuros despojos às portas da cidade. Zeus incluiu o leão entre as constelações a fim de perpetuar o feito do filho.

As Maçãs de Ouro das Hespérides; Os Bois de Gérion; O cinto da Rainha Hipólita; O Touro de Creta.


segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Tigela art déco com tampa - Sacavém





Peça de faiança moldada em forma de calote tendencialmente esférica assente em pequeno pé recuado. De cor branca com decoração estampilhada e aerografada com motivos vegetalistas, de flores e folhas, estilizados ao gosto art déco, em dois tons de castanho, que surgem do filete também castanho que cinge o bocal. A tampa de encaixe, com concavidade circular em cujo centro se eleva uma pega em forma de botão, tem decoração similar à da tigela. No fundo da base carimbos verde «Gilman e Ctª Sacavém Portugal» e carimbo oval «Made in Portugal». Uma “flor” igualmente carimbada a verde e um X pintado à mão da mesma cor.
Data: c. 1930 - 40
Dimensões: alt c. 24 cm (c/tampa) x diâm. máx, c. 23,2 cm 


Trata-se da decoração «nº 1011 para tijelas ou tijelões, com ou sem tampa», de acordo com o verbete da Fábrica de Loiça de Sacavém que se ilustra, gentilmente cedido pelo Museu de Cerâmica de Sacavém / Centro de Documentação Manuel Joaquim Afonso (MCS-CDMJA).


sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Escultura art déco «Falcão» - Hutschenreuther - Alemanha




Peça escultórica de porcelana moldada e relevada, de cor branca, representando um falcão descansando em pilarete cilíndrico sobre pé dodecagonal pouco espesso e muito pronunciado. Olhos, bico e a única pata visível a ouro, assim como o filete que circunda a base do pilarete e a faixa que remata a parte superior do pé. No fundo da base, carimbos verdes ovais, com Leão e L. H. S., e Lorenz Hutschenreuther, A. G. Selb § Abteilung für Kunst, e, inscrito na pasta, «18».
Data: c 1927 (carimbo 1919-c.1928)
Dimensões: alt. c. 28,5 cm


Trata-se do modelo nº 184 da autoria do Prof. Wilhelm Krieger. O naturalismo da escultura é mitigado pela simplificação e depuração das formas que remetem para uma estética moderna acentuada pela desornamentação do pilarete e do pé, de gosto art déco. Este distanciamento ao naturalismo é sublinhado pela ausência de cor e pelos contidos apontamentos a ouro. De qualquer modo, na atitude solitária e altiva do predador, em consonância com o despojamento do suporte, ecoam ecos de um simbolismo ainda não de todo esquecido. 

 
Wilhelm Siegmund Anton Louis Krieger (1877 - 1945) foi um escultor alemão. Em 1912 casou-se com a professora de arte e ceramista Emilie Butters (1879-1962).
Tendo frequentado a escola de arte de Munique, onde estudava pintura de paisagem, que abandonou, desde o início do século XX começou a praticar escultura enquanto autodidacta.
Começou, então, a dedicar-se à escultura animalista, no início muito inspirada pela gramática Art Nouveau, ganhando depois contornos mais estilizados, que produziu em bronze, pedra e cerâmica.
Enquanto membro das Vereinigten Werkstätten für Kunst im Handwerk, da Münchner Werkstätt, que integrou a fundação do Deutsche Werkbund de que já falámos, Krieger vai, em parceria com a escultora Jena Martha Bergemann Konitzer (1874-1955), conceber porcelana de mesa que será produzida pela fábrica Rosenthal, que a levou à Primeira Exposição Internacional de Arte Decorativa Moderna, realizada em Turim, em 1902. No mesmo ano participa na Exposição Nacional de Arte Alemã, em Dusseldorf.
Participou depois em diversas outras exposições, como na Secessão de Munique, em 1907, e antes da Primeira Guerra Mundial, em 1914, na Grande Exposição de Arte de Berlim.
Concebeu trabalhos para os departamentos de arte de várias fábricas de porcelana, como por exemplo Heubach ou Hutschenreuther, tendo colaborado nesta última com o Prof. Fritz Klee de quem já também apresentámos peças.
Em 1927, recebe o título de professor honorário dado pelo Ministério da Cultura da Baviera. Continuou a expor, sobretudo na Haus der Kunst, de Munique, até ao ano que antecedeu a sua morte. 

domingo, 13 de janeiro de 2013

Jarra “Lírios-do-vale” Gustavsberg - Suécia




Jarra de grés, em forma de taça oblonga e bocal côncavo, no sentido do comprimento, assente sobre pé troncocónico invertido sobre pequeno anel, da linha Argenta, com aplicação de prata em fundo esmaltado verde mate. Nas quatro faces, ornamentação, a prata embutida, com ramo florido de lírios-do-vale. No bordo e pé, filete de prata embutido. No fundo da base, estampado a ouro, a marca Gustavsberg, o símbolo «âncora», «Argenta», «Made in Sweden» e, pintado à mão, também a ouro, «A 23» e «Y».
Data: c. 1955
Dimensões: alt. 8,2 cm x diâm. 8,6 cm x 7,8 cm


Hoje regressamos à Suécia e à produção da Gustavsberg. Trata-se de uma peça que foge um pouco ao nosso critério cronológico e estético preferencial, mas que adquirimos porque achámos interessante a evolução e decadência de uma linha que chegava ao fim. Nela se nota o esgotamento da linha Argenta criada por um dos nossos designers de eleição, Wilhelm Kåge, ainda nos anos 20, e cujo apogeu se centra, sobretudo, nas produções do seu criador entre c. 1930 e c. 1945. Porém, esta peça tardia apresentava outras características que nos agradaram. Em primeiro lugar, pela singularidade da forma, integrada no espírito das freeforms, então em voga, que os escandinavos vão explorar como ninguém. Por outro lado, pela singeleza da decoração, com a representação, em cada uma das quatro faces, da haste florida de um lírio-do-vale graficamente representada.

A peça apresenta uma delicada forma em pequena taça, mais que propriamente de jarra que efectivamente é, para receber um pequeno bouquet de flores, que, em Maio, seriam, naturalmente, lírios-do-vale. A jarra torna-se, assim, símbolo permanente de um desejo de bons augúrios como passaremos a explicar.


Celebração e renovação da Primavera, o lírio-do-vale (em francês muguet) simboliza o regresso à felicidade depois de passado o Inverno. Pelo que estas pequenas flores brancas em forma de campainhas, em França, Bélgica e Suíça, por exemplo, são tradicionalmente oferecidas aos familiares e amigos no dia 1 de Maio para lhes trazer felicidade. Assim sendo, converteu-se na flor oficial do dia do trabalhador.
Muito representada durante a Belle Époque, acabaria por conhecer um novo élan nos anos 50.

Enquanto símbolo de regresso à felicidade e de boa sorte, foi a flor preferida de Christian Dior, que era muito supersticioso. O muguet foi utilizado pelo criador de moda, como motivo de inspiração das suas célebres criações na collecção Primavera-Verão de 1954. Dois anos mais tarde, haveria de lançar um perfume à base de muguet que se tornaria icónico: Diorissimo. Tão supersticioso era que escondia esta flor nas bainhas dos modelos em dias de desfile inaugural das suas colecções. 
Por uma coincidência cronológica, ou não, dado que as tendências da moda contaminam as várias produções artísticas, seria também o muguet utilizado como motivo decorativo em várias peças dos anos 50 da série Argenta, de que esta pequena jarra é apenas um exemplo elegante e singelo, como a própria flor. (Veja-se exemplar com outra decoração aqui).


Espécie nativa da Europa, da família das convalariáceas, o lírio-do-vale (Convallaria majalis) é cultivada como flor ornamental que floresce em Maio. As hastes florais chegam a atingir 30 cm e as flores são muito odoríferas. Também é conhecido popularmente por campainhas, flor-de-maio, círio ou lágrimas-de-Nossa-Senhora (já que segundo a tradição cristã simboliza as lágrimas da Virgem Maria), e ainda por lírio-convale, convalária, ou, por influência francesa, mugué, muguet, muguete e muguete-do-vale.