Mostrar mensagens com a etiqueta Orientalismo. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Orientalismo. Mostrar todas as mensagens

domingo, 15 de julho de 2018

Jarra craquelé com decoração à chinesa – Sacavém



Jarra de faiança moldada, piriforme de colo invertido e pequena gola elevando o bocal circular. De cor branco-sujo e craquelé miúdo, apresenta, em lados opostos, decoração manual a preto e laranja, aplicada sobre o vidrado, com motivo de cerejeira retorcida com algumas flores, emergindo de um terreno ondulado às escamas, ao gosto chinês. Bocal cintado por corrente de elos a laranja e preto intercalados. No fundo da base, carimbo preto «Gilman & Ctª – Sacavém» «Made in Portugal» sobreposto a outro carimbo idêntico amarelado, e, em relevo na pasta, «80».
Data: c. 1930 – 40
Dimensões: Alt. 14 cm


A Fábrica de Loiça de Sacavém é uma caixinha de surpresas. Desta vez uma inesperada - pelo menos para nós que desconhecíamos este tipo de produção - jarra craquelé com decoração de chinoiserie. As cores são totalmente art déco e a estética orientalizante, presente também no craquelé, acentua esse gosto pelo exótico que se manteve durante os anos 20 e 30, senão mesmo por toda a primeira metade, do século XX. Não sabendo a data de produção é por estas características formais que a datámos. De qualquer maneira encontamos semelhanças nesta decoração com a de 1927/1929 que o artista vidreiro francês Schneider baptizou "Bonzai".  Uma peçazinha de qualidade que demonstra bem que Sacavém era outa loiça…


domingo, 15 de outubro de 2017

Jarra art déco com flores de Raoul Lachenal – França


Jarra art déco de grés porcelânico, modelada em forma de balaústre, de cor verde-bronze antigo mate, com decoração de flores estilizadas, a branco-mosqueado igualmente mate, de corolas poligonais irregulares, raiadas a partir de centro circular. As flores, de diferentes tamanhos, serpenteiam de um só lado subindo pelo bojo, num esmalte espesso delineado a corda seca. Bocal saliente em forma de anel liso. No fundo da base, pintado à mão, a castanho, «Raoul Lachenal».
Data: c. 1920
Dimensões: Alt. 18 cm


Trata-se de uma peça bem exemplificativa do abandono da estética Art Nouveau por Raoul Lachenal que, mantendo o japonismo, aligeira e geometriza a decoração de acordo com os novos cânones que a exposição de Paris de 1925 haveria de sintetizar. Uma estética que, na sua simplificação de formas e decorações, oscilou entre o culto do objecto único e irrepetível e a produção seriada para consumo mais alargado.

Claramente influenciada pelas formas e decorações do Extremo Oriente, esta jarra remete igualmente para os trabalhos de bronze dessa região e para a dinanderie tão em voga na França à época.

A técnica do petit feu utilizada por este ceramista, que integra um grupo menos preocupado com a tradição, procura a renovação da arte milenar da cerâmica graças a novas experimentações mais abertas ao tempo que passa, às modas ou à própria personalidade dos criadores. (Edgar Pelichet – La Cèramique Art Déco, 1988).

Dado o esmalte verde-bronze não recobrir uniformemente a superfície da jarra, transmite a ilusão de uma pátina antiga, de matéria envelhecida e suja pelo tempo, ideia retomada no branco-mosqueado das flores, o que confere à peça um requinte e uma sumptuosidade de grande expressividade.

Raoul Lachenal, percebendo o seu tempo, foi dos poucos grandes ceramistas mundiais, a par de Bonifas, que, sem abdicar da peça artística e única, procurou produzir seriados.


Um aparte: quando, na nossa colecção, integramos peças Arte Nova japonizantes, pretendemos ilustrar, para nosso gozo pessoal, a evolução de um gosto que marcou indelevelmente a estética ocidental e a Art Déco em particular, de que esta jarra é um modelo exemplar.

domingo, 29 de maio de 2016

Velador orientalista “garçonne et prince oriental”- Limoges, França


Peça de porcelana moldada art déco, policroma, representando um par do Próximo Oriente, de pé, com a figura masculina abraçando uma bailaria, dentro da moda “garçonne et prince oriental”. As carnações das duas figuras são ligeiramente rosadas. O homem tem barba preta e veste túnica, com capuz caído sobre as costas, de cor marfim forrada a vermelho, com motivos florais estilizados igualmente a vermelho e preto, sobre veste amarelo-torrado. A cabeça apresenta-se coberta por outro capuz, de cor marfim, decorado com motivos geométricos das cores da túnica. A figura feminina, com cabelo à garçonne apresenta-se de frente, tronco nu, com calças de balão de base marfim listradas verticalmente a ouro e verde, presas à cintura por uma faixa negra. Na mão, pendente, um leque. No fundo da base «Limoges» e assinado «Rauche». Instalação eléctrica de origem.
Data: c. 1925-30
Dimensões: alt. 31cm x larg. 13cm


Na teatralidade da representação, do gesto, a figura masculina protege e deseja a frágil jovem. Terá servido para iluminar qualquer câmara mais íntima, um quarto, talvez, de um apartamento burguês nos anos 20 ou de inícios de 30, ou de um lupanar sofisticado. Fantasia, romance, sedução, desejo, num ambiente saturado de sedas e brocados, perfumes inebriantes… tudo conjugado para uma noite memorável a dois ou será apenas ilustração de um sonho solitário de celibatário? Tantas possibilidades…

A ideia romântica que o Ocidente concebeu das «Mil e uma noites», exacerbada depois no cinema, com filmes como «The Skeik», deu origem a todo um imaginário de liberdade e fantasia que pouco estava em consonância com a realidade.

O Orientalismo foi uma moda dentro da pintura de género que atravessou o século XIX, reforçada pelas campanhas de Napoleão e que culminou com a descoberta do túmulo de Tutankamon em 1922. Um fascínio pela civilização desaparecida do Egipto Antigo misturava-se – ou emparceirava - com o mundo muçulmano. A Sublime Porta, a mítica Istambul, essa passagem entre dois mundos, horizonte recortado de cúpulas bizantinas e de émulas otomanas acrescidas de minaretes, era ainda Europa mas tinha tudo já de outro continente e de outra civilização. O exotismo de uma Ásia que alastrava pelo Sahara escaldante do Norte de África até encontrar o Atlântico. O Próximo Oriente circundava a margem sul do Mediterrâneo e esse fervilhante mundo outro, estendia-se de Marrocos à Pérsia. A expansão do Islão difundiu por todo esse vasto território certos usos e costumes, maneiras de vestir e arquitecturas. Por ser demasiado misterioso e ambíguo, terras de desertos sem fim, por vezes tão sem horizonte como um oceano, o Ocidente olhou para ele como se se tratasse de um todo uniforme com pequenas variantes.


O fascínio pelos espaços infinitos de paisagens inóspitas mas hipnóticas, ausentes de verde mas ricas na paleta de ocres. Ergs e hamadas, com ou sem ouadis, formam os desertos. Essas paisagens dunares ou pedregosas remetem para mil aventuras. Aí, encontrar ou não um poço de água ou um oásis verdejante de tamareiras e sicómoros, pode fazer a diferença entre a vida e a morte, mas na ficção os heróis sobrevivem sempre e no fim têm a princesa ou o príncipe encantado dos seus sonhos nos braços. É que Xerazade, Aladino, Ali Babá, Sinbad, tapetes voadores, edifícios cúbicos, cúpulas bulbiformes, minaretes, crescentes, portas em ferradura, arcos conopiais, hammams, odores a essências preciosas e especiarias, salões ocultos pejados de ouro, diamantes, rubis, esmeraldas e safiras, e, como parte da banda sonora, o apelo do muezim, mito e realidade, tudo se funde na nossa imaginação colectiva ocidental.
Daí que sultões, paxás, odaliscas, bailarinas, vizires, encantadores de serpentes, servos de vários géneros, mercadores e mesmos populares de todo o Próximo e do Médio Oriente, inundaram um imaginário pleno de luxúria e prazeres carnais. A ideia de harém suscitava, suscita ainda, os mais loucos desejos e fantasias, sobretudo por parte da população masculina. A pintura de Ingres serviu para exaltar toda essa ideia de voluptuosidade, de corpos desnudos e paixões à flor da pele.


Em grande parte das representações ocidentais, as vestes deste outro, de uma maneira geral, amplas, tanto podiam dar a descobrir carnações como tapavam toda e qualquer curvatura de um corpo humano. É isso que podemos constactar em grande parte das artes decorativas do período Art Déco. Até porque de burca, niqab, hiyab ou chador a mulher desse Oriente é estranhamente misteriosa. Não permitindo o islamismo que a mulher mostre do corpo mais que a cara e as mãos, e, em casos mais extremos, nem mesmo isso, no resguardo de quatro paredes imagina-se que tudo se altere e atinja refinadas formas de sedução.

É deste paradoxo que o elemento feminino deste velador, talvez uma odalisca, se alimenta, sendo bem exemplo da visão distorcida que o Ocidente tinha de uma civilização que se lhe afigurava plena de sensualidade.

terça-feira, 22 de dezembro de 2015

Prato de cozinha com motivo de mesquita - Sacavém


Prato de cozinha de faiança moldada, formato circular com aba larga e lisa. Decoração central estampilhada e aerografada, policroma. Sobre fundo branco, duas estampilhas a amarelo e castanho estilizam o motivo de mesquita, com espelho de água em frente e margem oposta em primeiro plano, onde se erguem duas palmeiras (tamareiras), à esquerda, definidas por duas outras estampilhas a castanho-mel e verde. Bordo com barra aerografada a cor-de-rosa que se esfuma em direcção ao centro. No fundo da base, carimbos verde «Gilman & Ctª – Sacavém – Portugal» e «946».
Data: c. 1930-40
Dimensões: Ø32 cm x alt. 5,5 cm


A arquitectura de uma mesquita otomana à borda de água, muito provavelmente um rio, com as duas tamareiras em primeiro plano, servindo de repoussoir, remete para o exotismo de um qualquer deserto do Próximo Oriente, o Egipto, por exemplo. Como se a mesquita turca do Cairo tivesse descido até ao Nilo.

Decorações idênticas podem ser encontradas em bases para bolos alemãs (infelizmente perdemos uma das imagens que tínhamos para ilustrar) e noutras peças cerâmicas da mesma nacionalidade.

Embora com raízes ainda setecentistas e que o espírito do Romantismo desenvolveu, este tipo de representações de um misterioso e exótico Oriente Próximo alimentaram o imaginário do Ocidente século XX dentro. O fascínio que a espectacular descoberta do túmulo de Tutankhamon, em 1922, causou, ou antes a personagem Lawrence da Arábia (1888-1935) e a canção «The Sheik of Araby» (1921), depois o cinema, em filmes como «The Sheik» (1926), ou os cenários da intriga de algumas obras de Agatha Christie (o mais conhecido será «Morte no Nilo», de 1937), por exemplo, contribuíram para continuar a alimentar fantasias das “mil e uma noites” no imaginário e estética colectivos pelo menos até ao desencanto que eclodiu com a II Grande Guerra.


Exemplar idêntico já foi apresentado por MAFLS, que sobre o tema discorreu, e apenas rectificamos que se trata da decoração nº 946 «para malgas e pratos de cosinha», conforme desenho do fundo documental da antiga Fábrica de Loiça de Sacavém, disponível no Museu de Cerâmica de Sacavém - Centro de Documentação Manuel Joaquim Afonso, a quem dirigimos, uma vez mais os nossos agradecimentos, e conforme carimbo deste nosso exemplar.

Como os Reis Magos vieram do Oriente e o Menino também por lá nasceu, aproveitamos o motivo para desejar um


segunda-feira, 28 de maio de 2012

Jarra art déco “elefantes e palmeiras” da Villeroy und Boch – Mettlach


Jarra bojuda art déco, de faiança moldada, craquelé, com aplicação sobre o vidrado de pintura à mão, policroma, com motivo intercalado de quatro elefantes e igual número de palmeiras estilizados. Na base, carimbo Villeroy & Boch- Mettlach e Made in Saar. Inscrito na pasta, um número ilegível.
Data: c. 1931-35
Dimensões: Alt. 22,5 cm x diâm. máx. c. 21 cm

A pintura, expressionista, revela uma grande liberdade de pincelada, predominando os tons terrosos e cinzas que fazem ressaltar o verde da vegetação.


Trata-se de um outro exemplo de exotismo cuja temática, mais uma vez, nos remeterá para a Exposição Colonial de Paris de 1931. Neste caso, uma jarra fabricada pela V&B, cuja história já aqui focámos, que, em consequência da 1ª Guerra Mundial, se encontrava em território administrado pela França e pelo Reino Unido entre 1920 e 1935, data em que, por plebiscito, a Bacia do Sarre foi devolvida à Alemanha.


quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

Bomboneira art déco “Mouro” - Ernst Bohne Söhne - Rudolstadt




Caixa de forma antropomórfica representando um jovem “mouro” que, fazendo uma genuflexão, apresenta uma bandeja com oferta. Trata-se de uma peça composta por dois materiais distintos, com a parte inferior de porcelana moldada e policromada, e a tampa de metal (bronze?) parcialmente lacada.
A figura, ao gosto art déco de inspiração neo-rococó, apresenta em porcelana as calças largas cor de tijolo carregado, cobertas por “camisa” comprida branca, rodada, com decoração geométrica a verde, e sapato a ouro. Este vestuário cerâmico é complementado pela parte metálica, constituída pelo tronco da personagem, vestida com gibão apertado por faixa na cintura e a cabeça, cuja cara é lacada à cor do chocolate, porta turbante. (Agradecemos que nos esclareçam se não utilizámos terminologia adequada). Na base, apresenta a marca da fábrica Ernst Bohne Söhne, em Rudolstadt, de carimbo a azul com um N coroado (utilizado até 1921), e outro circular com Made in Germany. Inscrito na pasta, Germany DRGM [Deutsches Reich Gebrauchsmuster], que significa modelo registado do império alemão.
Data: c. 1918-21
Dimensões: alt. c. 15,5 cm

DRGM é um registo de modelo mais rápido e barato que um registo de patente. Estamos em crer que terá o mesmo significado do modèle déposé francês já referido a propósito das peças de Sandoz.



A Ernst Bohne Söhne foi fundada em Rudolstadt, na Turíngia, em 1848 pelo pintor de porcelana Ernst Bohne. Após a sua morte, em 1856, seus filhos, Gustavo, Karl e David, ficaram com a gerência da fábrica agora conhecida como Ernst Bohne Söhne (filhos). Algum tempo depois, os filhos de David, Bernhard e Marta, assumiram o controlo. Em 1919, a fábrica foi vendida aos Irmãos Heubach de Lichte. De 1919 até 1930, a empresa funcionou como um ramo da Heubach Co. A partir desta data a fábrica de Rudolstad entrou em crise e fechou. Em 1937, Albert Stahl, e outros reabriram a fábrica sob o nome de Albert Stahl & Co. Vormals [antiga] Ernst Bohne Söhne.

A marca de coroa e N usada por Capo di Monte, em Nápoles, desde cedo foi amplamente copiada por muitas fábricas, por ser um símbolo de prestígio, pelo que passou a ser utilizada como marca da própria Ernst Bohne Söhne. A partir de 1891 as peças para exportação receberam carimbo circular “Made in Germany”.

No antiquário em Viena, onde o comprámos, em 1994, informaram-nos que se tratava de um objecto raro, muito coleccionável. Então nem pensávamos propriamente em colecções, mas agradou-nos a forma, o requinte e, sobretudo, a mistura de materiais pouco habitual para o gosto português.
Só recentemente compreendemos a razão de ser do comentário e a maior curiosidade da peça. Para nós tratava-se apenas de um objecto de luxo e não víamos, por desconhecimento, mais que um bonito modelo em figura do mouro, recorrente nos exotismos europeus desde o século XVIII, e que tomámos por guarda-jóias.
O divertido é a publicidade implícita que a personagem comporta, natural para o comprador germânico coetâneo, que não desconhecia a existência do Mouro Sarotti. Quer pela figura, quer pelas cores, a caixa remete indirectamente para um símbolo publicitário desvendando, assim, a sua função de bomboneira.
Isto porque em 1868 Hugo Hoffmann abriu uma confeitaria na Mohrenstraße 10 (Rua dos Mouros, 10), em Berlim, para cujo cinquentenário, em 1918, um publicista criou a figura do negro «Sarotti-Mohr» (Mouro Sarotti) – um pouco como o lisboeta «Preto da Casa Africana» - ainda hoje extremamente popular nas embalagens de chocolates da firma, mesmo depois de se ter transformado num mágico branco a partir de 2004 …