domingo, 29 de março de 2015

Jarra dupla em 8 – Aleluia-Aveiro


Jarra dupla, de faiança moldada, contracurvada em forma de 8, estreitando em direcção à base. Sobre os vidrados a azul e amarelo pálidos, com lustre, que acentuam a divisão da peça em duas partes, recebeu nas superfícies exteriores um grafismo (estampilhado manualmente?) a preto de caules filiformes, aparentemente paralelos, com folhas lanceoladas, estilizadas, cujos limbos são tracejados a castanho na cor amarela e a branco na cor azul. As superfícies dobram para o interior mantendo as mesmas cores sem decoração. Na parte central, sobrelevada, uma abertura oblonga, cujo interior foi destacado a cor-de-laranja. Rebordo do bocal duplo a branco. No fundo da base, carimbo castanho «Aleluia Aveiro» com um «Il» pintado à mão, a preto, sobrepujando carimbo da mesma cor «Fabricado Portugal» inscrito num rectângulo, e, à mão, a preto, 750-A.
Data: c. 1955
Dimensões: alt. 14 cm x larg. 14,5 cm x 5,5 cm


Mais uma vez a numeração, «750», indica-nos o modelo e o «A» corresponde à decoração, a primeira de toda uma série, correspondendo o «II» ao pintor.

A forma, que se aproxima da de um cesto duplo com a alça furada para poder ser pendurado, apresenta um movimento da torção muito expressivo. Porém, o dinamismo da forma parece ser contrariado pela rigidez um tanto formal dos elementos decorativos vegetalistas graficamente estilizados que, paradoxalmente, cumprem um ritmo óptico de escola. De facto, a depuração gráfica do desenho não podia ser mais anos 50 seguindo as tendências internacionais de então.



A paleta cromática suave, nos seus tons pastel nacarados, é dramaticamente contrariada pela abertura oblonga realçada a laranja forte, a cor mais característica, em nossa opinião, da produção moderna freeforms, da Fábrica Aleluia-Aveiro do período. 

domingo, 22 de março de 2015

Prato de cozinha art déco flores estilizadas – Lusitânia-Lisboa


Prato de cozinha de faiança moldada, com decoração art déco no covo, de flores estilizadas e motivos geométricos, policroma, estampilhada e areografada. Aba aerografada a lilás, em esfumado na direcção do seu centro, e com motivo livre ziguezagueante a castanho mais próximo do bordo. No fundo da base, carimbo estampado verde em forma de escudo com cruz de Cristo, encimado por coroa, Lusitânia CFCL - Portugal
Data: c. 1930 - 40
Dimensões: Ø 34 cm x alt. 5 cm


Da unidade de Lisboa da Companhia das Fábricas de Cerâmica Lusitânia (C F C L) chega-nos uma das decorações art déco mais interessantes, em nossa opinião, aplicadas à faiança popular do estilo feita em Portugal. Embora a linha ziguezagueante que circunda a aba remeta ainda para um gosto popular oitocentista o que sobressai é a contemporaneidade do grafismo central.

A assimetria da composição, a geometrização das flores e os motivos geométricos e, sobretudo, o despojamento dos elementos ornamentais no vazio, agrada-nos particularmente.

Até agora, pelo menos, não encontrámos referência de fábrica estrangeira que utilizasse esta ornamentação. Motivos de bordados regionais podem ter sido a fonte de inspiração, mas também encontramos afinidades com certas serralharias, madeiras entalhadas ou mesmo baixos-relevos ornamentais (cerâmicos ou pétreos), aplicados em arquitecturas, francesas mas também americanas (por via francesa), como se ilustra (imagens retiradas da net no Pinterest).



domingo, 15 de março de 2015

Cinzeiro-cigarreira art déco «Gato» - Sacavém


Cinzeiro-cigarreira de faiança moldada e policroma, suavemente craquelé, em forma de gato estilizado. O animal, de cor alaranjada e nacarada, com apontamentos a preto, é representado deitado de barriga para cima, formando uma concavidade que serve de receptáculo para as cinzas, com patas dianteiras também para cima e patas traseiras segurando o rabo. Na cabeça erguida, de grandes olhos azuis esbugalhados e expressão sorridente sob os bigodes, com uma abertura circular no canto esquerdo da boca para um cigarro, tem um chapéu, cor de laranja com pala preta, perfurado por cinco orifícios circulares para enfiar cigarros. No fundo da base, carimbo azul acinzentado «Gilman & Cta – Sacavém» e «Made in Portugal». São visíveis as marcas da trempe.
Data: c. 1935-45 (?)
Dimensões: Alt. 9,5 cm x larg. 9,5 cm x comp. 9,5 cm


A figura corresponderá à designação «Cinzeiro Formato Gato», com o nº 272, que aparece nas tabelas de preços de «Loiças decorativas em faiança» de 1945, a 10$00 (na de 1950 aparece a 20$00).

A gramática estilizada da peça em forma de gato remete-nos para a banda desenhada da época, e para o famoso Gato Felix (Felix the Cat), de quem já aqui escrevemos, no post de 1 de Junho de 2013, a propósito de gato da Lusitânia-Coimbra.

Peça irónica, o animal ostenta uma expressão sorridente, arriscamos mesmo a dizer viciosa, tal o deleite transmitido pelo prazer de fumar. É reflexo de uma época em que os pequenos bibelots preenchem o vazio do quotidiano com cor e humor.


O período entre as duas Grandes Guerras oferece-nos uma miríade de objectos fantasistas que povoam as decorações de interiores e quotidianos. Foram anos onde o bibelot e a ironia fizeram parte de um universo onde se simplificaram formas e decorações por oposição ao gosto mais rebuscado da Belle Époque. O Art Déco, nas suas mais variadas expressões estéticas, permitiu superar a angústia da carnificina da I Guerra e nos Anos Loucos as pessoas aprenderam a rir-se de si mesmas. Se por um lado, numa primeira fase, concebeu ambientes e objectos luxuosos, selectivos e requintados, por outro lado, depois de 1929, a Grande Depressão propiciou uma produção de massas mais em consonância com os tempos de crise que se viviam e onde opções estéticas mais populares do estilo contribuíram para a criação de ambientes descontraídos, coloridos e cheios de vida. Em todo o caso, a tendência foi ambos os tempos serem modernos e, dentro do possível, feéricos. 



domingo, 8 de março de 2015

Jarra art déco da linha Flambé “Lamas” da Rörstrand – Suécia


Faz algum tempo que não apresentamos nenhuma peça da linha «Flambé» da fábrica sueca Rörstrand, sobre cuja génese e técnica já nos debruçámos. Mais uma forma criada por Gunnar Nylund (1904-1997), desta vez com a decoração nº 2001 de O. Dahl (datas desconhecidas).

Jarra de grés moldado, de forma tendencialmente esférica achatada lateralmente, com pé e bocal salientes. Bojo com decoração aerografada em cremes e castanhos flamejados (flambé), com realces a ouro no contorno do desenho e circundando pé e bocal. Esta técnica dá à peça um aspecto metalizado como se fosse dinanderie. Tendo como pano de fundo montanhas, numa das faces, um par de camelídeos (lamas?) em pose estática (um pasta outro de pescoço erguido), na face oposta dois animais da mesma espécie em corrida. No fundo da base carimbo a ouro: FLAMBÉ RÖRSTAND, com ALP inscrito num quadrado e ladeado por MODELL NYLUND e sobrepujando LIDKÖPING SWEDEN DEKOR: O. DAHL; UNIK: 2001. Inscrio na pasta 3 estrelas, ALP e HANDDREJAD
Data: c. 1935-40
Dimensões: Alt. 15.5 cm x Ø 15 cm


Tema recorrente do Art Déco, o exotismo está mais uma vez presente nesta peça, quer na paisagem andina, quer nos motivos animalistas representados, uma espécie de camelídeo da América do Sul, muito provavelmente lamas (Lama glama), embora também possam ser outras espécies suas semelhantes caso das alpacas (Lama pacos), vicunhas (Vicugna vicugna) ou guanacos (Lama guanicoe).

A estilização de todos os elementos representados, reduzidos a uma expressão gráfica, que quase diríamos minimalista, dada a grande economia no traço, impossibilita uma identificação exacta da espécie.

Numa das faces, um par de animais pasta numa paisagem árida e montanhosa, apesar da expressão observante e alerta de um deles perante a eminência de um possível perigo que espreita. Na face oposta, talvez sequência da primeira, um par de animais em fuga, com um deles atento a uma ameaça não visível que os persegue.