sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

Par Romântico 1 - La Maîtrise (Limoges?)




Estatueta de porcelana branca moldada e policromada, em forma de par galante oitocentista (c.1840- c.1860), numa reinterpretação estilizada ao gosto art déco. As carnações das duas figuras são ligeiramente rosadas. A figura masculina, de barba e cabelo mel, da mesma cor das calças, veste casaca cinzenta e abraça, a figura feminina, que beija na face, trazendo chapéu alto na mão esquerda pendente. A mulher apresenta uma ampla saia rodada, com flores coloridas, rematada com dois grandes folhos brancos. Blusa verde-claro com punhos azul forte. Por cima do conjunto, um xaile de renda branco. Na cabeça, touca igualmente verde com flor de pétalas brancas contornadas a rosa, atada ao pescoço com fita azul forte que se desenvolve num laço. Interior vazado. No fundo da base, no bordo, carimbo verde La Maitrise.
Data: c.1925
Dimensões: alt. c. 25 cm x comp. c. 25 cm x larg. 19 cm


Trata-se de uma produção provavelmente de Limoges para La Maîtrise, o atelier de arte das Galerias Lafayette, em Paris, de que já tivemos oportunidade de dar notícia
Decidimo-nos a postar esta peça hoje, depois de termos visto o filme «Lincoln» recentemente estreado. Uma lição de história, bem contada, e melhor representada, certamente destinada aos alunos americanos. Enquanto cinema, enfim …



Relegada aos trabalhos domésticos e educação dos filhos, a função social da mulher de condição limitava-a ao papel de esposa e mãe. Em consonância, a moda feminina de meados de Oitocentos era bem o sinal de um tempo em que às mulheres era elidida a sexualidade e negados os direitos. Veja-se, nesta estatueta, como num tempo de libertação da mulher, nos loucos anos 20, se revisitava ironicamente o puritanismo de uma outra época que corresponderia à juventude das avós.
A figura submissa da mulher, protegida pelo galante dandy, traz uma ampla saia que pousa sobre uma armação de modo a acentuar o seu rodado, salientando, por contraste, a estreiteza do busto. A cabeça tapada por uma touca e um xaile sobre os ombros realçavam o recato que a mulher deveria ter. Todos os movimentos naturais do corpo ficavam condicionados quer pela rigidez da saia quer pelo espartilho que lhe impedia a respiração. Quantos desmaios não encontramos na literatura da época, transformados em condição de elegância feminina, quando não passavam de falta de oxigenação do sangue …


Em relação ao filme, à moda e aos desmaios, já agora, e por contraste, veja-se o incomparável «E tudo o vento levou». Está lá tudo, em palavras e imagens. E viva o Cinema e Scarlett O’Hara!

2 comentários:

Maria Andrade disse...

Olá AM-JMV,
Adorei estes dois pares românticos com que nos brindaram esta semana! São bem diferentes de outros pares que julgo serem de fabrico alemão, com figuras estáticas em poses forçadas e toscas que inundaram o mercado no início do século passado. Mas para além da beleza das figuras, gostei das descrições minuciosas e do enquadramento que fizeram neste post, estabelecendo a relação com a moda feminina e o papel que se pretendia subalterno da mulher. E claro, estas saias volumosas, não podem deixar de nos levar à figura da Vivien Leigh como Scarlett O’Hara...
Em suma, dois belos posts em sequência!
Bjos.

AM-JMV disse...

Cara Maria,
Para nós o mais interessante em coleccionar é sobretudo apreendermos a intencionalidade subjacente à forma. É esse o fascínio que, pelos vistos, nos prende e, estamos em crer, se depreende em ambos os nossos blogues. ;)
Bjs