Escolhemos para comemorar o aniversário uma jarra de que
gostamos muito, não só visualmente, mas também pela matéria: o grés. Para além
das texturas que tal cerâmica possibilita, agrada-nos o peso das peças, maciças
e compactas. Um prazer para o tacto e para a visão.
Jarra de grés, modelada (?) em
forma de balaústre, quase inteiramente coberta de cristalizações,
predominantemente a verde-claro, parcialmente aureoladas a castanho-escuro na
área onde sobressai, em reserva, a cor verde-olivina mosqueada de fundo. Bocal
e interior beige acinzentado brilhante e liso. No fundo da base, inscrito na
pasta, à mão, ARenoleau e A [Alfred Renoleau - Angoulême].
Data: c. 1910
Dimensões: Alt. 25,5cm
Alfred Renoleau (1854-1930)
nasceu em Mansle na Charente, filho de um barbeiro-cabeleireiro e, tal como era
tradição na época, estava destinado a suceder-lhe no negócio.
Contrariando a vontade dos
pais foi sobretudo como autodidata que aprendeu, desde cedo, a arte de
ceramista.
Tal como tantos outros da
sua época, imbuídos de espírito romântico (pensemos em Rafael Bordalo Pinheiro,
por exemplo), apaixonou-se pela arte de Bernard Palissy (c. 1510-c.1590), vindo
a ser um dos mais conhecidos ceramistas do século XIX influenciados pelo
artista francês do Renascimento. Em paralelo produzia também faiança
tradicional decorativa e utilitária.
A sua mestria nas peças à
maneira de Palissy foi plenamente reconhecida em Londres onde expõe em 1888. Este
sucesso vai despertar o interesse de uma grande empresa - Grandes Tuileries de Roumazières - que o contrata como ceramista-modelador.
O contrato vai durar dois anos, de 1888 a 1890.
A empresa, aliás como toda a
França, queria celebrar condignamente o centenário da Revolução Francesa no
prosseguimento da renovação nacional a fim de preparar a “vingança” contra o Império
Alemão e recuperar a Alsácia-Lorena ocupada. Contrata assim o
“artista-modelador” para participar na Exposição Universal de Paris de 1889 com
tal sucesso que ganha uma medalha de ouro. Renoleau é também premiado com uma
medalha de bronze a título individual pelas suas peças à maneira de Palissy que
produziu até ao fim do século XIX quando os gostos mudaram.
Em 1891 muda-se para
Angoulême para onde vai trabalhar como artista cerâmico, e no ano seguinte é
contratado como professor de modelagem da École
départementale d’Apprentissage.
Três anos depois, em1895, funda
a Faïencerie d’Art d’Angoulême, que vai
dirigir até à sua morte em 1930. A empresa continuará sob a direcção do seu sobrinho
e, de algum modo, chegará até hoje, visto os seus descendentes continuarem a
criar e a trabalhar a cerâmica.
Todavia, não é o tipo da
produção descrita que nos motiva. A abertura do Japão ao mundo nos anos de
1860, vem renovar no Ocidente o gosto pelo grés. O fascínio pelas peças
japonesas de formas depuradas em que a ornamentação se reduzia aos sumptuosos
esmaltes que cobriam as superfícies levou os artistas, sobretudo europeus, a
tentarem desvendar os seus segredos.
Fascinado pelo que viu na
exposição de 1878, que já referimos em post anterior, Jean Carriès criou
magníficas peças de grés e rodeou-se de discípulos que continuaram a sua obra.
Sèvres irá aperfeiçoar a técnica dos esmaltes cerâmicos durante a administração
de Alexandre Sandier (de 1897 a 1916) ao obter o desenvolvimento de
cristalizações na superfície do esmalte.
2 comentários:
Carissimos:
As minhas felicitações e agradecimentos pelos três anos de constante partilha de exemplares cerâmicos de excelente qualidade e pelos textos de estudo e divulgação que os têm acompanhado.
De facto, as cristalizações de AR atingem grande qualidade, suplantando por vezes as que Pierrefonds apresenta. Pena é que, neste período, e talvez porque pretendesse dar primazia apenas aos efeitos das mesmas, as suas peças não tenham apresentado modelações ou formatos mais ousados.
Deixo aqui uma ligação para outras peças de Renoleau que, eventualmente, já terão visto:
http://mfls.blogs.sapo.pt/tag/alfred+renoleau
Saudações!
Caro MAFLS, agradecemos os parabéns.
De facto existem muitas semelhanças com Pierrefonds. Alfred Renoleau não foi um revolucionário na sua arte. Até porque teve sempre um grande cuidado a gerir a empresa que criou e que sustentava a família, por isso não podia correr riscos. As formas são depuradas e, digamos, clássicas, mas frequentemente inspiradas no Extremo-Oriente. E, claro, o que sobretudo o interessava era as possibilidades técnicas e estéticas dos esmaltes no grés. Quanto às peças que refere, claro que as conhecíamos. São posteriores à morte de AR, em 1930, feitas no período de seu sobrinho e filho adoptivo Joseph Roullet que assina AR A. Sapiência recém adquirida...
Abraço
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